segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Remela

Parte.
E quando partires, leva contigo
todos os cacos que restam
de ti
não quero mais nada
Nem a migalha do instante
Nem a fumaça do ensejo
Não quero nem um último beijo
Nem quero mais o que queria antes.
Nem mágoa
resta agora.

Parte
Sem demora e para longe
Que teu tempo é abstrato
E o meu, é contrato
com uma cláusala minúscula na nota-de-rodapé:
Esqueça o grude; minha cola
- que é mais forte que as letras
que a poesia tange
e que as palavras
que em meu ouvido urgem -
me manterá de pé.

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Prosa e pausa

É no lapso entre espaço e tempo que o lápis encontra a mão e escreve sobre o vazio das coisas. E eis que desse instante de ausência surge um papel em branco onde se lê translucidamente a história do dia-a-dia dos braços e do tronco e das pernas que acompanham o punho sem força e sua mão esquálida e imóvel. Mas o lápis, como todo bom assessório da inexistência, se recusa a escrever sobre a cabeça cheia de idéias. O lápis desconhece o perpétuo. É efêmero como um aceno de miss e se deixa apagar facilmente. Só reconhece que deve ser apontado até desaparecer para todo o sempre. Já a caneta, não. A caneta se tampa de todos os lados para que não lhe vaze o conteúdo. E faz de tudo para não por em vão sua cor no papel virgem e tingir acidentalmente a mão pálida e ignóbil. A caneta tem mira certeira: atira na linha para atingir a alma. Ela descreve aquilo que o corpo é incapaz de traduzir. Fala da presença. Fala da palavra. E a grava. E é uma falha grave ignorar que a caneta tira da cabeça confusa e sonolenta dois dedinhos de alguma coisa. Alguma coisa assim menor que o sonho e assim maior que a luz do dia. Não é bem prosa, é letargia.









E a poesia brota daí.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

O justo tanto da sina (ou Quando os sinos tocam)

Há um quê
de cereja e mentira
em toda verdade
Há um quê
de suspiro e salitre
em toda menina
Há querer
e afastar escondidos
em toda saudade
Há um tanto
de incerteza e fascínio
em toda Marina.

E há muito de
promessa e mudança
em toda segunda.
Mas tempo, não há.
Já é terça.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Soneto de depois de amanhã

Na epigrafia de seus ombros
desenhei meu rastro
Vi a lua ir de encontro ao chão
e a noite virar dia.

Nos traços de sua caligrafia
desenhei meu nome
Mas vi que era um escrito vão
e meu sofrer perdeu o lastro.

Sem satélites, quero astros!
Quero analisar dor e tempo
de consciência sã.

E é só assim que me atento:
não há semelhança alguma
entre ontem, hoje e amanhã.